'Reserva Natural', de Rodrigo Lacerda

No ano de 1995  o autor e historiador fluminense Rodrigo Lacerda (1969-), aos 25 anos, lançava o seu primeiro livro, 'O Mistério do Leão Rampante' (editora Ateliê), no ano seguinte ganhava o Prêmio Jabuti de Literatura na categoria melhor romance. De lá pra cá, 23 anos se passaram, outros livros vieram, assim como a repetição do Prêmio Jabuti com 'O Fazedor de Velhos' (Cosac Naify, 2008) e o seu trabalho como editor e tradutor de livros.  Este ano o autor lançou 'Reserva Natural', antologia de contos com orelha assinada pela escritora carioca Adriana Lisboa.


O livro possui 10 contos, espalhados por 184 páginas com variações de tamanho e dividido em duas partes: Território e Fauna. Para o autor, o título traz uma ambiguidade; tanto a reserva como um fundo de natureza clandestina que cada um possui dentro de si como também a reserva ecologicamente protegia. O conto 'Sempre assim', por exemplo, toca na instabilidade afetiva de nossas relações ao abordar um momento de rompimento, e como esse rompimento abre espaço para o desaparecimento do outro diante de nossos olhos como um horizonte perdido e enclausurado pelo avanço da noite.
"Você já traiu a sua mulher?"
Ainda me recuperando do susto, respondi que não, nunca.
Difícil responder a essa pergunta sem mentir - é tênue a fronteira entre a virilidade e a cafajestagem. Roberto me olhou entendendo. (p. 37)
'Reserva Natural', o conto que dá título a coletânea, é um dialogo em fim de noite entre afilhado e padrinho (esse vítima do câncer) trazendo revelações que indicam uma possível traição na família, o que faz soar, ao mesmo tempo, um clima de tensão, desconforto e nostalgia. É um conto já publicado anteriormente em uma edição da Revista Granta, em 2010.


Outros contos também abordam de forma clara a natureza como em 'Polinização' que tem como pano a investigação do processo sexual das orquídeas através dos insetos, mas também é sobre as relações humanas atuais em que o narrador questiona se "Haverá algum santo remédio para a instabilidade afetiva da minha geração?" (p. 50).

'Concurso' talvez seja o que mais se difere das histórias anteriores em termos de forma e conteúdo. Trata-se de uma história que elabora uma representação de como se dá o desenvolvimento de um concurso literário, onde autores enviam seus livros e recebem avaliações de uma banca julgadora, um deles um escritor que já alerta “buscar unidade em livro de contos é como chamar a namorada para a suruba e depois ficar com ciúme".


Em uma mescla de previsão e horror, o conto 'Metástase' é catastrófico, através de um personagem portador de um tumor maligno e que passa a criticar o caminho que a medicina tomou ao longo dos anos, passando pelas consequências para o planeta terra em um dilema: devemos oferecer meios de vivermos mais ou vivermos menos mas sabendo que nossas gerações futuras também terão a oportunidade de poder viver? "[...] Ainda não dá para saber quando a vingança natural nos exterminará, mas o fim previsto é mais ou menos o seguinte", alerta o narrador elencando seus tópicos. 

É com esse o clima pesado e realista que o livro termina, levando a uma reflexão profunda e pertinente sobre o futuro da humanidade, o que por si só já é digno de leitura.

Ainda em tempo: 'Reserva Natural' venceu o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Artes (APCA de literatura) em sua categoria.
x.x.x


Título: Reserva Natural
Autor: Rodrigo Lacerda
Editora: Companhia das Letras
Ano: 2018 
ISBN: 9788535930771
Gênero: Contos / literatura brasileira 
Páginas: 184
Resenha de número: 420
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